Teoria
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Música absoluta: uma breve análise meta-crítica

 (2008, segundo semestre)


Andersen Viana


Resumo

Pretende-se, neste fragmento, perscrutar pontos polêmicos presentes na obra crítica de dois pensadores representativos da música culta da atualidade: Susan McClary e Kofi Agawu, dentro de uma perspectiva criativa, musical e educacional, com ênfase em algumas particularidades objetivas e subjetivas.


A análise

Sobre os fundamentos da Teoria da Música, Kofi Agawu assevera que a análise contemporânea exerce cada vez mais um papel central, apesar de constituir-se uma disciplina relativamente jovem. Tal análise é associada ao formalismo.

Ora, desde que a análise contemporânea é associada ao formalismo, desde que a nova musicologia é, dentre outras coisas, um movimento anti-formalista e, considerando ainda, que desde que a disciplina da teoria é constituída em grande maioria por analistas praticantes, seriam, pois, os objetivos da teoria – de um lado, e da nova musicologia, de outro –, fundamentalmente, incompatíveis.

Susan McClary, por sua vez, defende a posição de que uma das mais importantes correntes da musicologia tem estado presente no processo de desmistificação da música absoluta, baseando-se em códigos de significado social, bem como afetivos e narrativos.

O projeto de McClary está intrinsecamente ligado à critica musical de Theodor Wisegrund Adorno, que traçou a história da subjetividade burguesa e suas contradições através da mesma música instrumental que aparenta ser impenetrável para esta análise.

McClary oferece não somente uma, mas várias narrativas. Narrativas estas que não investem pesadamente na estrutura técnica –- no sentido dado por Adorno –- do movimento da sinfonia.

Susan McClary relaciona os temas “masculino” e “feminino” localizando-os em janelas particulares nos parâmetros convencionais do sistema tonal e da sonata, e diz que o respectivo trajeto já está definido antes mesmo da composição começar. O masculino está predestinado ao triunfo; o feminino, à solução.

Em sua crítica a McClary, Agawu ressalta a atipicidade da dissonância com respeito às convenções que sustentam os procedimentos da narrativa no movimento, colocando o tema masculino protagonizado pelo “pai” como atípico e uma aberração.

Ao mesmo tempo em que Agawu reconhece que existem detalhes suficientes para suportar as caracterizações específicas para o que McClary deseja realizar, ele questiona se um teórico poderia forçar narrativas precoces tais como esta para dentro dos detalhes da música.

Não poderia a análise – que não é apenas relacionada com a questão do
A-Ab, que ela diz ser o real dilema do movimento – caminhar para outras relações semitonais, tais como: terças com expansão e contração motívica e algumas grandes trajetórias construídas pela periodicidade de Brahms? E a grande questão, contudo, não seria trazer o questionamento do real valor desta mesma análise para as condições das caracterizações de McClary?

De acordo com Agawu, a análise teórica conduz o analista ao verdadeiro conteúdo da obra intermediado pela estrutura técnica – em referência a Adorno –, a qual permite à mente musical engajar-se diretamente com os elementos composicionais – como a análise parece ser de utilidade limitada em um projeto que interpreta música como discurso social.

A verdade parece ser que os novos musicólogos não têm encontrado uso para os excessos de detalhes dos procedimentos da análise na teoria da música.

O fracasso da analista para alcançar um objetivo extra-musical, o fracasso dela em providenciar uma tradução da análise para o que não tem rótulo ou tradução, reside, necessariamente, fora das fronteiras do discurso social. Este, além de outros aspectos merecem menção. Ulteriores textos darão conta da tarefa.



Andersen Viana
Doutorando em Composição Musical pela Escola de Música da Universidade Federal da Bahia. Autor de 253 obras musicais. Maestro-compositor, produtor cultural e professor da Fundação Clóvis Salgado / Palácio das Artes e Escola Livre de Cinema (Belo Horizonte, Minas Gerais). Homepage: www.andersen.mus.br.

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