26.05.2009 - O Globo - Opinião - P. 7 - Leonel Kaz - Uma proposta essencial

Está para ser votado, na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, projeto de lei do governador Sérgio Cabral, propondo a transformação do Theatro Municipal em organização social de cultura (OS). Armou-se contra, mais uma vez, uma barafunda em torno do assunto, bem típica dos tempos do Chacrinha, que apregoava ter vindo aqui “para confundir e não para explicar”.

Venho com o objetivo oposto, qual seja, o de explicar aos queridos funcionários do Theatro Municipal e à distinta platéia o porquê de ser vital a aprovação desse projeto.

1) Dirijo uma OS – o Instituto de Arte do Futebol –, que gerencia as atividades do Museu do Futebol. Esta OS é vinculada à Secretaria de Cultura do Governo do Estado de São Paulo, que faz uma dotação anual ao museu. Assim, não é verdade que os governos criam OS e, depois, as abandonam; por isso, o Theatro Municipal do Rio de Janeiro não deixará de ser ad aeternum mantido pelo poder público, como vem sendo desde sua fundação, há quase 100 anos.

2) A OS é tão somente uma forma de administrar esses “paquidermes burocráticos” em que se transformaram instituições como o nosso centenário Theatro Municipal. Já fui gestor público da administração direta, assim como da administração indireta. Definitivamente, nenhuma delas sobrevive à interminável sequência de instâncias de aprovação, que despendem tempo e eficiência. Numa OS, um processo de pessoal não precisa ser submetido à Secretaria de Administração, nem um parecer jurídico à Procuradoria do Estado, nem a liberação de recursos à Secretaria de Fazenda. Não! A OS recebe os recursos e os administra sempre dentro do balizamento da lei 8.666, que trata das licitações.

3) Há doze anos, o governador Marcello Alencar procurou seguir o exemplo do seu colega de São Paulo, Mário Covas, que criara uma OS para gerir a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP). Pelas mesmas razões obtusas alardeadas hoje, o projeto foi engavetado. Uma década depois, a OSESP é a mais importante orquestra do país, com um movimento anual acima dos R$ 60 milhões. Seu sucesso é retumbante, aqui e lá fora. O número de gravações se multiplicou. Seus componentes são os mais bem pagos do Brasil. A exemplo do Museu do Futebol (uma OS!), também a Pinacoteca do Estado (uma OS!) e o Museu da Língua Portuguesa (uma OS!), tornaram-se instituições notáveis e atuantes.

4) Por que, se dá certo no Brasil e mundo afora, um grupo de funcionários do Theatro Municipal insiste em mantê-lo como enclave territorial da mais anacrônica e infértil burocracia? A Associação de Amigos serve como um tapa-buracos para pagamentos de horas extras e afins, que o regime da administração pública não permite. Já as OS podem receber dotações e recursos privados de toda sorte, participar de projetos incentivados, estabelecer convênios com a Secretaria de Educação, agir como empresa. E continuar com sua destinação pública!

Finalmente, não é verdade que as tradições e a continuidade do trabalho serão quebradas. Uma OS premia num plano de cargos e salários, o mérito e a evolução na carreira. Os direitos adquiridos dos atuais funcionários serão mantidos pelo projeto de lei. Portanto, peço aos coristas, músicos e bailarinos que não impeçam – por pura teimosia ou desconhecimento – que esse Theatro Municipal e vocês mesmos vivam melhor e mais produtivos nos próximos 100 anos. Ninguém está indo para um embate; ao contrário. E o amor de cada um de vocês ao Theatro Municipal não é maior do que o de cada um de nós que os aplaude.

O autor é curador e diretor da organização social que dirige o Museu do Futebol, em São Paulo.

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