12.05.2013 - O Globo - Segundo Caderno - P. 10 - Audrey Furlanetto - PINACOTECA VAI pedir DOAÇÕES NA entrada: sob nova gestão, instituição paulista terá máquina de cartão na porta em postura "agressiva" na busca por recursos.

Tal qual instituições internacionais — como a britânica Tate Gallery, que tem imensas caixas para doações logo na entrada de suas galerias —, a Pinacoteca do Estado (de São Paulo) vai à luta: anteontem, recebeu um lote de máquinas de cartões de débito e crédito que, ainda neste mês, serão colocadas logo na porta aos visitantes do museu.

— Instituições prestigiadas do mundo todo pedem dinheiro ao público descaradamente. Não podemos mais ter esse pudor — argumenta Paulo Vicelli, diretor de relações institucionais e de captação de recursos da Pinacoteca.

Vicelli é um dos três novos diretores da instituição, das mais prestigiadas do país e que tem, entre seus parceiros, a "descarada" Tate. Ao lado de Ivo Mesquita (que dirige a área técnica e de curadoria) e de Miguel Gutierrez (à frente do departamento financeiro), ele é uma espécie de "coringa" da nova gestão da Pinacoteca.

Se as outras duas diretorias existiam centralizadas na figura de Marcelo Araújo (que deixou a instituição depois de dez anos, em 2012, para assumir a Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo), o posto de Vicelli foi criado no fim do ano para reforçar um foco dessa gestão: a sustentabilidade do museu e o engajamento do público — não só como visitante, mas também como "patrocinador" da instituição.

— Precisamos transformar o prestígio da Pinacoteca em público, mas em público participativo, que apoie financeiramente o museu. Ainda temos muito pudor em pedir dinheiro, em dizer que as instituições precisam de recursos. Precisamos perder a vergonha.

Daí as máquinas de cartão na porta no museu e a campanha de marketing que promotores farão na entrada, de imediato, a fim de vender os programas de amigos ou patronos da Pinacoteca. A ideia é que os "amigos" (que pagam a partir de R$ 100 e têm direito a entrada gratuita) passem dos atuais 120 nomes para 240 até o fim do ano. Vicelli conta que ligou para cada um dos 120 a fim de se apresentar, agradecer e, claro, fidelizar os doadores.

— No Brasil, é muito difícil fazer as pessoas doarem algo para a instituição. As pessoas até gostam do museu, participam, acompanham, mas não têm esse desprendimento de doar, o que é até natural, pois não temos essa cultura. Os americanos fazem isso muito bem, doando bibliotecas inteiras para universidades, por exemplo. No Brasil, além da Biblioteca Mindlin, não se tem outro exemplo que vem rapidamente à cabeça. Queria que as pessoas começassem a pensar assim no Brasil — completa.

No caso dos patronos da Pinacoteca, que contribuem com R$ 12 mil ao ano, a ideia é passar de 42 para 60 membros. Aqui, explica Vicelli, é preciso manter algum tipo de "exclusividade", já que os patronos participam efetivamente na compra de obras de arte contemporânea — reúnem-se com o conselho e elegem as compras entre sugestões apontadas pela curadoria.

Atualmente, dos cerca de R$ 30 milhões do orçamento da Pinacoteca, 60% vêm do governo de São Paulo, e os demais 40% são, sobretudo, de patrocinadores que usam a Lei Rouanet para apoiar a casa. As doações, no entanto, estão longe do sonhado pela nova gestão da instituição, que recebeu 500 mil visitantes no ano passado.

A curadoria complementa os esforços para atrair público. Em parceria com a Tate, a mostra de Mira Schendel é das mais aguardadas de 2014 (abrirá o ano na Pinacoteca). Há ainda no programa exposição de outro artista idolatrado no meio, Leonilson.

— Gostaria que as pessoas olhassem a questão da doação no Brasil por esse viés, de acreditar numa causa, e não pelos benefícios que se pode ter. Você se engaja porque acredita naquele projeto. O resto é extra.

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