30/03/2004 - O GLOBO - Daniela Name - Uma atriz que não cabe no panfleto.

Veterana do teatro, Maria Pompeu divulga suas peças entregando propaganda nas filas e bilheterias da cidade.

Quem entrega o panfleto nas filas para espetáculos de dança e teatro da cidade não é um jovenzinho contratado por alguns caraminhguás por noite. Sempre impecavelmente vestida, a atriz Maria Pompeu, de 67 anos – 51 deles dedicados à carreira – panfleta para divulgar suas peças. Há semanas em que chega a enfrentar três textos diferentes. E ainda encontra tempo para entregar propaganda na boca das bilheterias da concorrência, onde já virou figura conhecida. E admirada. Não só pela classe e pela elegância dos figurinos, mas também pela obstinação.

Adrenalina demais impede atriz de ficar parada: – panfleto porque acho importante, mas não, mas não porque goste disso. Resolvi que não podia ficar parada esperando divulgação de tudo o que faço na mídia, mas ao mesmo tempo não me conformava com o baixo público – diz Maria, que no entanto, reconhece que sua boca-de-urna nem sempre surte efeito. – O público que dá retorno para os panfletos é baixíssimo. Mas mesmo assim continuo na ativa, porque não consigo ficar parada. Não consigo descansar.

No caso da atriz, a frase não é uma figura de linguagem. Maria descobriu há pouco tempo que é hiperadrenalítica. Tem energia demais, fica ansiosa nos momentos de repouso e encontra dificuldade até para se concentrar na leitura de uma revista.

– Se parar de trabalhar, acho que morro – diz ela. – Acho que é por isso que, mesmo sem conseguir trabalhar tanto na TV, luto para fazer meus espetáculos e panfleto para todos eles. Queria ter tido uma carreira mais fácil. Mas, como isso não aconteceu, tento seguir do jeito que posso.

Filha única de uma costureira viúva, Maria brinca ao dizer que foi feminina “pela circunstância dos fatos”, já que nunca soube o que era ter um homem provedor dentro de casa. Precisou lutar contra o preconceito materno quando, em 1952, entrou para o Teatro Duse a convite de Paschoal Carlos Magno. A estréia profissional viria três anos depois, em “Diálogo das carmelitas”, com Dulcina de Moraes. Em 1956, a atriz passou a trabalhar num banco, para poder custear os estudos na companhia de Dulcina. Nos anos 60, entrou para a Rádio MEC, onde começou a trabalhar como repórter.

– O tempo na Rádio MEC me mostrou um universo novo, com pessoas de cabeças diferentes das do mundo do teatro, que às vezes são muito fechadas – lembra ela. – Saía com meu gravador de dois rolinhos e conversava com gente muito interessante, como (os poetas) Carlos Drummond e Cecília Meireles.

Ela já estava na Rádio MEC quando, em 1962, fez o filme “Boca de Ouro”, tragédia carioca de Nelson Rodrigues dirigida por Nelson Pereira dos Santos e estrelada por Jece Valadão. Para Maria, o que poderia ser uma glória – fazer um texto de Nelson dirigida por um grande nome do cinema nacional – acabou prejudicando sua carreira.

– Eu ficava com os seios de fora em uma das cenas. Também tinha feito shows com Carlos Machado e sido eleita uma das “Certinhas” do Stanislaw Ponte Preta. Naquela época não era como hoje, que as pessoas acham o máximo a mocinha da vez posar nua. Nunca fiquei nua, mas acho que o seio de fora em “Boca de Ouro” serviu para que as pessoas deixassem de me ver como uma atriz séria. Eram outros tempos.

Uma carreira ligada a espetáculos literários.

Muito ligada à literatura, a atriz já encenou espetáculos sobre Drummond e Vinícius de Moraes. Agora se prepara para fazer o circuito de teatros do Sesc no interior e na Baixada com “Amor, feminino, plural”, coletânea de textos sobre a mulher.

– Gostaria de ter mais bons papéis na TV e no teatro, o que é muito difícil na minha idade – admite ela. – Mas tenho uma postura pró-ativa, não fico resmungando em casa. Até porque acho que me condeno à morte se ficar trancada em casa.

« voltar