20/10/1999 - Veja - Internacional - Complexo de Asterix - Mario Sabino

“Pátria de luminares como Montaigne, Voltaire, Descartes, Molière, Balzac, Flaubert, Sartre. Berço do iluminismo, dos direitos do homem e do cidadão. Terra do foie gras, do roquefort, do crepe, do champanhe, do vinho. Da moda e da perfumaria. De quebra, o país cuja capital é simplesmente Paris. Ninguém questiona a força da história, da cultura e da identidade nacional da França. Com exceção dos próprios franceses. Neste final de século, eles estão sofrendo mais do que nunca de algo que também inventaram: crise existencial. Sentem-se ameaçados pelo hambúrguer, pela hegemonia internacional da língua inglesa, por Hollywood. Enfim, por aquela nação a quem presentearam com a Estátua da Liberdade, os Estados Unidos. O último grito dos franceses (de um punhado deles, para ser mais exato) é contra o lançamento avassalador de Star Wars; Episódio I - A Ameaça Fantasma, do diretor americano George Lucas. Desde a semana passada, o filme está sendo exibido em 700 salas do país, 200 das quais só em Paris. A visão das filas intermináveis na frente dos cinemas é um pesadelo para intelectuais. Pela enésima vez, eles tentam esboçar uma reação. Em recente encontro com os setenta maiores empresários da área audiovisual de todo o planeta, o sociólogo Pierre Bourdieu, nome respeitadíssimo no universo acadêmico francês, condenou “a redução da cultura à condição de mercadoria”. Para ele, a literatura, o cinema de autor, a arte e até a ciência estão em perigo no reino “do comercial”, dominado pelos grandes conglomerados. Em paralelo à fala de Bourdieu, o primeiro-ministro francês Lionel Jospin declarou que, na próxima reunião da Organização Mundial do Comércio, apoiará o protecionismo no que se refere aos produtos culturais. “Reivindicamos o direito de apoiar nossa produção, convencidos de que o compromisso da diversidade cultural é essencial”, disse Jospin”.

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