28.06.2005 - O Globo - Primeiro Caderno - País - P. 13 - Priscila Guilayn - Chico Buarque afirma que o país vive um movimento de idiotice globalizada.

Chico: "A idiotice nos rodeia". Compositor diz que acha ridículo ser chamado de sexy.

MADRI. Na Espanha para lançar seu livro “Budapeste”, Chico Buarque disse ao jornal catalão “La Vanguardia” que vivemos, nas últimas duas décadas, um “movimento de idiotice globalizada”. Mas no Brasil, de 15 anos para cá, essa idiotice vem crescendo perigosamente, na opinião dele, que afirma não gostar de ser considerado um ícone da música brasileira, que se aterroriza ao ser chamado de “monstro sagrado” e acha ridículo que, em sua idade, esteja na lista dos homens mais sexy do Brasil.

— A idiotice nos rodeia. Eu mesmo tenho medo de virar um idiota — diz.

Contaminar-se desta idiotice faria que tudo fosse mais fácil, que nada mais lhe surpreendesse e que, inclusive, pudesse viver de dar entrevistas sem escrever livros:

— Eu digo que vou escrever um novo livro e passo dois anos dando entrevistas. Depois falo do livro que não saiu… e assim passa a vida. Hoje é possível viver de feira literária em feira literária. Há festivais a cada semana em alguma parte do mundo. Agora me consideram escritor e posso viver como turista literário. Certamente conseguiria ser muito mais conhecido como escritor do que sou hoje sem a necessidade de escrever mais livros.

Chico reconhece que sempre buscou reconhecimento no seu trabalho, mas critica a “fama boba, vazia”, que ele define como a sombra do reconhecimento, que é o interesse pela forma física de um artista ou por suas amantes.

— Há 40 anos não era assim. Estávamos todos bêbados em Ipanema dizendo coisas absurdas, mas nada disso saía na imprensa. Hoje, um artista vai ver um jogo de futebol e vem um jornalista e pergunta o que você achou do jogo. Não gosto disso.

Chico diz que a era da idiotice começou na década passada:

— Não gosto de recordar dos anos 60 nem dos 70. Dos anos 80 não me lembro e nos 90 começou a idiotice. Gosto de estar vivo, fazer as coisas no meu ritmo, sem pressões.

Ele disse ainda que as mulheres sempre o surpreendem e que as opiniões femininas lhe interessam mais que as masculinas, e que ter três filhas foi formidável.

— Elas são melhores do que o pai. Se cada um de nós pudesse dizer isso, se Bush dissesse isso, em 30 anos teríamos um mundo melhor.

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